Logo percebe que, as embarcações não necessitavam somente de hastes-de-lenha, na primeira oportunidade, adquiriu na cidade de Óbidos, uma leva de estivas e confecções em geral, transformando a casa, num comércio de porte médio o que, em poucas semanas foi esvaziada, dada a grande procura.
Em pouco tempo, corre a notícia na região de um novo empreendedor e os ribeirinhos passam a fazer encomendas e propõem a troca de produtos regionais. Em face da oportunidade de ouro, Macário de Assunção, recorre a sua reserva financeira, investe em confecções, acessórios para a pesca, caça, produtos para a pecuária, navais, pólvora, chumbo, espoleta, linhas de pesca, anzóis de todos os tamanhos, toneladas de sal, espingardas, e uma linha completa de peças de reposição para os motores Kelvin e Sefles, - muito usados naquela época na região.
Em cinco anos, precisou abrir mais um comércio, desta feita, no alto rio Nhamundá, cuja finalidade, ficar mais próximo do consumidor potencial que eram os madeireiros e funcionários da Petrobras que iniciavam as primeiras explorações de petróleo na região e o elevado contingente de trabalhadores extraindo óleo de pau-rosa.
Percebendo a vulnerabilidade do velho pai, agora doente, passa a lhes dar total assistência, oportunidade em que o convence a viajar a cidade natal e tratar da saúde. Dez meses depois, com o pronto restabelecimento, o pai retorna e intercede junto aos velhos amigos políticos no sentido de viabilizar uma elevada função para o filho no governo do amazonas. Fato este viabilizado, conseguindo nomear Francisco Macário de Assunção Filho, como terceiro sargento da Policia Militar do Amazonas, mas, exercendo a função de delegado geral de polícia na ilha Afonso de Carvalho.
Passado cinco anos, o pai veio e falecer e Francisco Macário passa a exercer com mão de ferro o mais importante cargo de um Distrito na época. Em todos os quadrantes do Distrito o delegado impôs ordem e todos cumpriam a risca. Quem saísse da linha, era recolhido a uma das suítes confortáveis da delegacia na Avenida Jonathas Pedrosa e forçado a cumprir a pena que ele mesmo impunha com serviços pesados nos campos ou capinando e varrendo as ruas da Ilha. Ele passou a ser a Lei.
Dado ao choque de ordem que o maior comerciante e delegado impôs logo os ribeirinhos passaram a chamá-lo de Coronel. E todos passaram a chamá-lo assim, as crianças e jovens lhes tomavam a benção, e até para facilitar a política de boa vizinhança, a maioria dos moradores passaram a batizar os filhos desde que o Coronel Macário, fosse o padrinho. Desse modo, em poucos anos, Macário, passou a ter o maior número de afilhados na região.
Investido do cargo e fazendo valer as suas ordens, o curso natural dos negócios só prosperou, pois, a rede de clientes aumentava a cada dia e todos preferiam pagar em dinheiro, uns poucos que compravam fiado, jamais atrasavam os compromissos, pois, ninguém queria correr o risco de ir preso por débito para o empresário e delegado/coronel.
Quando Macário juntou em cédulas o seu primeiro milhão de cruzeiros, colocou no cofre, pegou as chaves e guardou-a debaixo de uma tábua sob a cama. Agora estava seguro e já podia pensar em ter uma esposa. Boa pinta e despontando como um dos dez homens mais ricos da região não teve nenhuma dificuldade em contrair casamento com uma bela jovem do município de Faro - Pará.
Um casamento bem simples, porém, assistido pelas autoridades locais, tanto do Amazonas quanto do Pará. Às dez e meia da noite os comes-e-bebes se encerrou e o empresário e a esposa se recolheram. Mirtes Baraúna de Souza, agora passou a chamar-se, Mirtes Baraúna de Assunção. Uma senhora extremamente decente, dedicada aos afazeres de casa, ainda encontrava tempo para ajudar a receber e conferir os estoques de mercadorias que chegavam pelos pequenos navios de ferro. Na maioria das vezes, os barcos passavam de três a quatro dias para fazer o desembarque e embarque.
Uma senhora humilde. Não usava nenhuma maquiagem, raras vezes aplicava um pouco de laquê nos cabelos castanho-escuro para ir a algum aniversário. O único hábito que tinha, era aplicar leite de Rosas, nas maçãs do rosto. Afinal, era a coqueluche da época, - a sagrada fórmula do grande farmacêutico amazonense, Francisco Olympio de Oliveira-.
No mais, em poucos momentos de folga, estava a cuidar dos canteiros nos fundos do quintal ou do jardim de roseiras brancas situado na entrada da portentosa escada que dava acesso ao maior comércio do Distrito, que agora passou a de fato ser seu também.
O tempo passa, e Francisco Macário abre uma nova frente de negócios entrando no ramo da marchantaria. Para viabilizar o novo projeto, começa a comprar áreas e mais áreas de terras, tanto na várzea quanto na terra firme. Em apoio logístico ao novo empreendimento, investiu alto adquirindo de uma só vez dez barcos/boieiros.
Com os campos verdejantes em capins de uma ponta a outra da extrema, anuncia que está comprando gado, mas, somente mamotes e vitelas. Na ocasião poucos entenderam. A sua meta era a engorda e a venda imediata principalmente para a base de pesquisas da Petrobras, visto estarem tocando uma frente de trabalho com mais de quinhentos homens.
Os contados concorrentes, logo caíram fora da região, pois, não tinham como fazerem frente, com o agora forte empresário. Assim pouco a pouco, Francisco Macário, foi canibalizando a escassa concorrência e em poucos anos, passou a dominar o mercado da carne vermelha.
O que poucos perceberam, é que, o mega empreendedor foi se transformando no maior comprador e fazendeiro da região, e também, no maior proprietário das terras mais propícias para a pecuária e a agricultura.
Enquanto isso, a dona Mirtes, continuava dando conta do estoque de mercadorias que já ultrapassavam mais de dois mil itens. Conta-se que certo dia, após um almoço, atou a rede para tirar a soneca de praxe, a escapula abriu e ela veio ao chão. O baque foi tão grande que lhe atingiu profundamente a coluna vertebral e a bacia, em menos de oito meses veio a falecer dado ao traumatismo pélvico.
Viúvo, Francisco Macário, apõe a fita preta da viuvez no bolso na camisa-volta-ao-mundo e toca a vida em frente. Durante uns nove meses se entrega de corpo e alma ao trabalho, até que um certo domingo, resolve ir fiscalizar a fazenda do Curiá, onde outrora, trabalhou de empregado e agora era o proprietário, ocasião em que conheceu uma linda loira moradora da extrema, que, um ano depois, lhe deu o filho, Rosaltino Duque. Após o parto a criança e a mãe, receberam todo o apoio financeiro do Coronel, mas, quando o garoto completou três anos de idade, os avos e a mãe o entregaram, o que prontamente foi aceito de bom grado.
O garoto, sem a mãe, passou a ser criado pela velha ajudante do Coronel, dona Hermantina de Albuquerque, e como todos estavam sempre ocupados, o menino em vez de estar brincando com outras crianças e ou estudando, ficava trançando por entre mercadorias e fregueses, ou seja, foi criado dentro do comércio. Ao completar nove anos de idade o pai passa as primeiras lições de aritmética. Macário punha sobre a velha mesa de cedro, uma folha de papel de embrulho em uso do balcão, retirava um dos lápis do estojo onde mantinha a lata de rapé e com a voz estridente entregava ao Rosaltino as primeiras tarefas.
Lá pelo meio dia, dava uma baforada no Astória e sentava-se para tomar a lição. Aos pés da mesa, se encontrava sobre uma saca de estopa, uma leva de caroços de milho esperando por Rosaltino, caso cometesse mais de três erros seguidos. Rosaltino Duque desenvolveu várias técnicas para não ajoelhar-se sobre o tapete de milhos. Quando perguntado sobre a operação de somar, fingia um olhar distante, na realidade estava calculando mentalmente enquanto fitava e contava os objetos distribuídos nas prateleiras. Razão de fazer questão de colocá-los sempre um pouco afastado de outros e assim acertava a quase todas perguntas, uma vez ou outra, dava uma ou outra, de propósito dava a resposta errada para o Coronel não descobrir a fórmula e raras vezes foi sentenciado ao castigo.
Fonte: Lison On line